terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Simulação: Contestação


TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA




Exmo. Senhor Juiz de Direito do

Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa,


O Ministro da Defesa, António Luís da Borga, residente na Avenida das Forças Armadas Nº14 3º Esquerdo, 1990-071 Lisboa

Na acção que lhe move a Empresa «Estamos nas Lonas, SA», NIPC 123 123 123, com sede na Rua Patrocínio, N.º 111, 2715-311, Lisboa
Vem por este meio deduzir


CONTESTAÇÃO


I – POR IMPUGNAÇÃO
Ainda que assim este Tribunal não o considere, cabe a R a contestação de toda a matéria relativa à sua defesa, nos termos do art. 83.º n.º 1 do CPTA, pelo que

I.1 – FACTOS


É verdade que o ora requerido celebrou um contrato de aquisição de bens móveis no dia 1 de Setembro de 2011 com a requerente.

Dá-se igualmente como provados os articulados 5º a 14º constantes da douta petição inicial, salvo o 8º relativo ao Caderno de Encargos (Doc. 6 da douta PI) uma vez que não foi o efectivamente acordado entre a autora e o réu, não sendo o Ministro da Defesa o Senhor Zé Pedro Aguilar-Preto, mas sim o Senhor Doutor António Luís da Borga (Anexo 1).

A autora alega no articulado 15º que a primeira prestação deveria ter sido cumprida até 30 de Dezembro de 2011.
Acontece que,

De acordo com o que ficou estipulado na cláusula 2ª n.º 3 alínea a) do contrato supra mencionado, a primeira prestação deveria ocorrer a 30 de Setembro de 2011.
Neste sentido,

À primeira vista até se poderia dar como um erro de escrita, sucede que a autora faz todas as suas alegações com base na data por ela indicada na petição inicial (30 de Dezembro de 2011).

Nem se podendo afirmar que a data constante do contrato está errada sendo certa a indicada na PI, uma vez que a data referente a 30 de Setembro foi a efectivamente contratada.

Não tendo a autora comparecido no dia 30 de Setembro para a entrega dos bens em causa (Anexos 2,3 e 4), após vários contactos telefónicos (Anexo 14), o réu procedeu à entrega de uma carta (Anexo 5) de modo a informá-la que aquela tinha entrado em mora.
Assim,

Na sequência do que foi na realidade acordado no contrato, o réu junta prova em como no dia 30 de Setembro estava disponível para receber a prestação (Anexo 2).
Ademais,

O segurança que se encontrava de serviço nos Armazéns da Direcção do Exército, pertencente ao Ministério da Defesa, sediado na Av. Infante Santo, nº 49, 1399-056 Lisboa, confirmou que ninguém compareceu para o devido cumprimento da prestação em apreço.

10º
Pelo réu foi recebida no dia 12 de Dezembro uma carta enviada pela autora na qual esta mostrava-se disponível para proceder à entrega da primeira prestação.
Acresce que,

11º
Nos dias 13 e 14 de Dezembro de 2011 havia uma paralisação dos serviços internos dos CTT, o que impossibilitou a entrega do aviso de recepção à autora antes do fim da greve (Anexo 6).
Assim,

12º
É facilmente perceptível que a autora nunca poderia ter-se dirigido aos nossos serviços na data por ela invocada no articulado 18º da douta Petição inicial.
Ademais,

13º
No articulado 20º a autora alega que efectuou várias chamadas frustradas no dia 12/12/2011 da qual junta respectivo documento comprovativo.
No entanto,

14º
A data referida pela autora e a data constante do extracto não coincidem, pelo que a sua falsidade é evidente.
Aliás,

15º
Ainda que as datas coincidissem, a verdade é que uma chamada frustrada em caso algum aparece mencionada num extracto telefónico, a não ser que pela autora tenha sido mal empregue o termo “frustração”, no qual não se compreende o não atendimento de uma chamada telefónica, parecendo ser esse o intuito.

16º
Quanto à paralisação dos serviços da Direcção de Aquisições, é manifesta a incoerência nas datas entre o referido na petição inicial (23 de Dezembro de 2011 a 3 de Janeiro de 2012) e no documento supradito como prova (23 de Março de 2011 a 03 de Janeiro de 2012.

17º
Fazendo um réu um esforço de interpretação e de boa-fé das alegações apresentadas pela autora dos documentos por ela juntos ao processo, facilmente se equaciona a falsidade de alguns meios de prova pela autora indicados, das quais deverá vossa Excelência retirar as devidas ilações. Pouco faltou para que a autora alegasse que o país se encontrava em guerra civil (tendo em conta a duração exageradamente longa da greve).

18º
Relativamente ao articulado 23º, apesar de considerarmos que é irrelevante para a presente causa saber onde se encontrava o Ministro António Luís da Borga, já que a autora demonstrou tanto interesse pelo paradeiro da pessoa do Ministro, fazendo-lhe a vontade aproveitamos para esclarecer que, ao contrário do que foi alegado pela autora, este não se encontrava em viagem de lazer mas sim na Base das Lages em visita oficial conforme entrevista anexada ao processo (Anexos 7,8 e 15).

19º
Mais uma vez, é evidente a má-fé da autora. Apesar de termos procedido ao envio de uma carta registada à autora para esta proceder à entrega (como consta no articulado 25º da douta petição inicial), a junção do aviso de recepção seria impossível atendendo a que ele é devolvido ao remetente, neste caso o réu.

20º
Dão-se por admitidos os factos alegados nos articulados 26º a 35º da douta petição inicial.

21º
É alegado pela autora no articulado 40º “Tendo em conta o complexo processo de construção das viaturas em causa e por força do atraso causado pela situação inesperada invocada no Art. 31º, as partes acordaram que o atraso de três meses se imporia a todas as outras prestações contratuais”.
Sobrevém que,

22º
A autora não juntou prova, cabendo à ré por este meio impugnar o dito acordo mencionado no articulado 40º da douta petição inicial.

23º
 Têm-se por verdadeiros os factos aludidos nos articulados 41º a 48º.

24º
O Réu recebeu uma carta da Organização das Nações Unidas (doravante ONU) no dia 11 de Julho de 2011, nos termos da qual foi solicitada a entrega de 100 viaturas militares blindadas Pãoduro até ao dia 30 de Outubro do mesmo ano (Anexo 9)



25º
Nestes termos, o réu, perante a circunstância de já se encontrar a decorrer um concurso público com vista ao fornecimento deste tipo de objecto, celebrou um contrato com a autora (vide articulado 1º).

I.2 – DE DIREITO
26º
Foi efectivamente celebrado um contrato de aquisição de bens móveis, nos termos do artigo 437º do Código dos Contratos Públicos (CCP).

27º
Foi estipulado que a primeira prestação seria cumprida no dia 30 de Setembro de 2011, o que em respeito do princípio da pontualidade, no âmbito do artigo 406º n.º 1 Código Civil (doravante CC), deveria ter sido estritamente satisfeito (762º CC).

DA MORA DO DEVEDOR

28º
Ao contrário do alegado pelo autor no articulado 64º, parece-nos não existir mora do credor, leia-se o réu, mas sim mora do devedor.

29º
Entende-se existir mora do devedor independentemente da interpelação nos casos de uma obrigação com prazo certo (artigo 805º n.º 2/a CC).

30º
Ora, do demonstrado supra, o devedor não só não procedeu à prestação na data convencionada (30 de Setembro de 2011), como apenas se mostra disponível para seu cumprimento a 12 de Dezembro de 2011.

31º
A mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor (art.804º/nº1 CC), tornando-se responsável pelo prejuízo que o credor tiver em consequência da perda ou deterioração daquilo que deveria entregar (art.807º/1 CC).

32º
Além do mais, o Réu procedeu à interpelação do autor no dia 06 de Outubro de 2011, conforme consta do Anexo 5.

33º
Na ausência de cumprimento, foi enviada nova comunicação à autora (Anexo 10) no dia 27 de Outubro de 2011 de modo a relembrar a devida prestação.

34º
Por parte da autora só houve resposta no dia 12 de Dezembro de 2011 (anexo 9 da douta petição inicial).

DO RISCO:

35º
Conforme consta do articulado 24º e do Anexo 9, o Estado Português encontrava-se vinculado com a Organização das Nações Unidas à entrega de 100 viaturas nas condições supra indicadas.

36º
Daqui facilmente se retira os graves prejuízos do incumprimento do contrato celebrado entre o Réu e a ONU e consequentemente a descredibilização externa daquele.



37º
Do princípio Pacta Sunt Servanta – artigo 406º CC – decorre uma obrigação de cumprimento da vontade contratada. Assim, tendo a autora incumprido a prestação no dia 30 de Setembro de 2011, o risco é da sua responsabilidade.

DO CUMPRIMENTO DEFEITUOSO:

38º
Relativamente à 2ª prestação de entrega de 60 viaturas para o dia 2 de Maio de 2012, verificou-se um cumprimento defeituoso.

39º
Segundo ROMANO MARTINEZ existe cumprimento defeituoso «sempre que o devedor realiza a prestação a que estava adstrito em violação do princípio da pontualidade do cumprimento» havendo «uma não conformidade; uma discrepância entre o “ser” e o “dever-se”».

40º
A dia 12 de Agosto de 2012 foi recebido pelo Réu um recibo (Anexo 11) da empresa Limpa Tudo, Lda, a qual está encarregue da limpeza das instalações do Ministério, no qual se constatou um súbito aumento de valores habitualmente exigidos.

41º
Estes custos extraordinários advieram de manchas de combustível que se encontravam no chão, exactamente debaixo dos veículos blindados entregues pela autora.

42º
Foi contactado um Engenheiro Mecânico, de seu nome Octávio Mariquinhas, que realizou a uma análise dos ditos veículos, tendo constatado que havia um depósito de combustível brutalmente degradado.

43º
Apesar da autora ter executado procedido à reparação das viaturas após os acontecimentos de 25 de Abril de 2011, pode verificar-se que as mesmas não ficaram devidamente reparadas, havendo uma desconformidade entre a prestação devida e a efectivamente realizada.

44º
Quando o réu aceitou as viaturas, a 3 de Agosto de 2012, desconhecia o dano, tendo em conta que nos termos do Caderno de Encargos cabia ao fornecedor, ora, à autora, garantir uma inspecção qualitativa e quantitativa da prestação (Anexo 1).

45º
Constituindo o cumprimento defeituoso um tipo de incumprimento gerador de responsabilidade contratual, é a autora responsável nos termos do direito substantivo (798º CC).

DA RESOLUÇÃO POR INTERESSE PÚBLICO:

46º
Prescreve o nº 1 do artigo 266º da Constituição da República Portuguesa: “A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.

47º
Outrossim, dispõe o Código dos Contratos Públicos (doravante CCP)  no seu artigo 278º: “Na prossecução das suas atribuições, e sempre que esteja em causa o exercício da função administrativa, os contraentes públicos podem celebrar quaisquer contratos administrativos, salvo se outra coisa resultar da lei ou da natureza das relações a estabelecer”.



48º
O contrato administrativo é, antes de mais, um contrato, logo, fonte de direitos mas também de obrigações recíprocas, um espaço de paridade das partes, cuja inobservância implica responsabilidade contratual. Porém, a sua natureza, finalisticamente ancorada no interesse público, leva a que o mesmo seja o centro de incidência de conjunto de poderes – deveres, funcionalmente adstritos à garantia não apenas do interesse público no cumprimento do contrato mas, sobretudo, da prossecução daquele através da relação contratual administrativa.

49º
Contudo, o interesse público não se confina nem se esgota no quadro de uma concreta actuação do ente público, antes, transcende-o, constituindo, também por isso, e em última instância, o parâmetro material da aferição da existência e/ou da pertinência temporal da razões que ditam a mobilização da via contratual – administrativa.



50º
Do exposto resulta, a razão de ser do poder de resolver o contrato prematuramente e por uma decisão unilateral sem que qualquer culpa ou falta contratual possa ser censurada ao co contraente.


51º

O artigo 312.º do CCP dispõe na alínea b) a possibilidade de resolução por razões de interesse público.  

52º

O artigo 334º do CCP reconhece expressamente as razões de interesse público como um dos fundamentos de e para a resolução unilateral do contrato.

53º

A propósito, a Administração é chamada a executar, concretizando, os postulados de interesse público decorrentes de escolhas feitas no âmbito da função política, normativa e inovatória ou primariamente através do exercício da função legislativa.

54º

Nesse sentido, à resolução do contrato pelo contraente público, está subjacente a ideia de “que a administração deve poder, não obstante as cláusulas convencionais, pôr termo aos contratos que se tornaram inúteis ou desajustados à necessidade da colectividade, sob reserva de indemnização do co-contratante; ela não deve ser obrigada a continuar a receber prestações inúteis ou que já não correspondem à sua política actual”.
55º

Especialmente presente tempo em de crise económica – financeira mundial e da problemática da dívida pública que obrigam os Estados a reequacionar as respectivas políticas de despesas públicas, e por maioria de razão, os encargos com as public procurement, podendo originar não apenas decisões de não adjudicação de contratos ou de adjudicação não acompanhadas de celebração do contrato mas também de modificação ou, no limite, resolução contratual (Anexo 12)
56º
Além do mais, não pode a Estamos nas Lonas invocar prejuízos resultantes a resolução do contrato pois conforme demonstra o Anexo 13 a Embaixada dos Estados Unidos da Améria já manifestou interesse em adquirir as viaturas.

57º
Perante o exposto, é de concluir que:

58º

O interesse público é o quid specificum da função administrativa do Estado e fundamento do poder de resolução contratual pelo contraente público.

59º
A resolução unilateral constitui uma garantia legal da prossecução do interesse público e deve ser operada no quadro do Estado de Direito.

60º
O interesse público justifica que o acto de resolução tenha a natureza de ato administrativo resolutório.


61º
O poder de resolução dos contratos administrativos, fora dos quadros da culpa, previsto no CCP afigura-se adequado à garantia da prossecução dos interesses comunitários definidos primariamente no âmbito das funções político – legislativas do Estado, mas a protecção jurídico–patrimonial conferida ao co–contraente vai além dos limites justificáveis pelo interesse público, sobretudo no contexto da crise do Estado Pós – Social.

62º

Cabendo tudo dentro dos limites do princípio da igualdade, da boa-fé e do pacta sunt servanda, bem como da assunção da eventual responsabilidade que o réu pode vir a ter pela prática de um acto lícito, nunca renunciando a ela, como já foi visto, pelas boas práticas contratuais e processuais supra evidenciadas.

PEDIDO RECONVENCIONAL:

63º
O réu sofreu danos decorrentes da mora.

64º
O réu considera-se no direito de exigir uma indemnização relativamente às constantes desconformidades entre o acordado e efectivado, nomeadamente:
1.      Pelos danos sofridos consequentes da mora, acrescidos juros de 4%, nos termos do 806º nº1 do CC;
2.      Pelos prejuízos decorrentes do incumprimento perante a ONU;
3.      Pelos danos resultantes do cumprimento defeituoso.


65º
Pede-se ainda a reparação das 18 viaturas danificadas, por conta da autora, Estamos nas Lonas, S.A.


Nestes termos,
-           Deve o pedido da acção ser julgado improcedente e em consequência o réu ser absolvido do pedido;
-     Deve a reconvenção ser julgada procedente e condenar a autora a efectuar o pagamento de €100.000.000,00.

As advogadas:
Ana Laura Falcão
Ana Miranda
Bruna Bilro
Carla Silva
Inês Vieira
Rute Fernandes
Vânia Ferreira

PROVA
Testemunhal:
1.      Gilberto Vê-Tudo: Segurança do Armazém da Direcção Geral de Aquisições do Exército (pertencente ao Ministério da Defesa), residente na Rua da Procedência nº4 3º Dto, 1990-325 Lisboa;
2.      Octávio Mariquinhas: Engenheiro Mecânico, residente na Avenida da Engenharia nº1 9º Dto, 1950-025 Lisboa;


JUNTA:
17 Anexos


Segue o link para acederem aos anexos:

https://www.dropbox.com/sh/r8mda9nd68c3xye/gSLcMqYaoZ?lst

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