TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA
Exmo. Senhor
Juiz de Direito do
Tribunal
Administrativo de Círculo de Lisboa,
O Ministro da Defesa, António Luís da Borga, residente
na Avenida das Forças Armadas Nº14 3º Esquerdo, 1990-071 Lisboa
Na acção que
lhe move a Empresa «Estamos nas Lonas,
SA», NIPC 123 123 123, com sede na Rua Patrocínio, N.º 111, 2715-311,
Lisboa
Vem por este
meio deduzir
CONTESTAÇÃO
I
– POR IMPUGNAÇÃO
Ainda que assim este Tribunal não o considere, cabe
a R a contestação de toda a matéria
relativa à sua defesa, nos termos do art. 83.º n.º 1 do CPTA, pelo que
I.1
– FACTOS
1º
É verdade que o ora requerido
celebrou um contrato de aquisição de bens móveis no dia 1 de Setembro de 2011
com a requerente.
2º
Dá-se igualmente como
provados os articulados 5º a 14º constantes da douta petição inicial, salvo o
8º relativo ao Caderno de Encargos (Doc. 6 da douta PI) uma vez que não foi o
efectivamente acordado entre a autora e o réu, não sendo o Ministro da Defesa o
Senhor Zé Pedro Aguilar-Preto, mas sim o Senhor Doutor António Luís da Borga (Anexo
1).
3º
A autora alega no
articulado 15º que a primeira prestação deveria ter sido cumprida até 30 de
Dezembro de 2011.
Acontece que,
4º
De acordo com o que
ficou estipulado na cláusula 2ª n.º 3 alínea a) do contrato supra mencionado, a
primeira prestação deveria ocorrer a 30 de Setembro de 2011.
Neste sentido,
5º
À primeira vista até se
poderia dar como um erro de escrita, sucede que a autora faz todas as suas
alegações com base na data por ela indicada na petição inicial (30 de Dezembro
de 2011).
6º
Nem se podendo afirmar
que a data constante do contrato está errada sendo certa a indicada na PI, uma
vez que a data referente a 30 de Setembro foi a efectivamente contratada.
7º
Não tendo a autora
comparecido no dia 30 de Setembro para a entrega dos bens em causa (Anexos 2,3
e 4), após vários contactos telefónicos (Anexo 14), o réu procedeu à entrega de
uma carta (Anexo 5) de modo a informá-la que aquela tinha entrado em mora.
Assim,
8º
Na sequência do que foi
na realidade acordado no contrato, o réu junta prova em como no dia 30 de
Setembro estava disponível para receber a prestação (Anexo 2).
Ademais,
9º
O segurança que se
encontrava de serviço nos Armazéns da Direcção do Exército, pertencente ao
Ministério da Defesa, sediado na Av. Infante Santo, nº 49, 1399-056 Lisboa,
confirmou que ninguém compareceu para o devido cumprimento da prestação em
apreço.
10º
Pelo réu foi recebida no
dia 12 de Dezembro uma carta enviada pela autora na qual esta mostrava-se
disponível para proceder à entrega da primeira prestação.
Acresce que,
11º
Nos dias 13 e 14 de
Dezembro de 2011 havia uma paralisação dos serviços internos dos CTT, o que
impossibilitou a entrega do aviso de recepção à autora antes do fim da greve
(Anexo 6).
Assim,
12º
É facilmente perceptível
que a autora nunca poderia ter-se dirigido aos nossos serviços na data por ela
invocada no articulado 18º da douta Petição inicial.
Ademais,
13º
No articulado 20º a
autora alega que efectuou várias chamadas frustradas no dia 12/12/2011 da qual
junta respectivo documento comprovativo.
No entanto,
14º
A data referida pela
autora e a data constante do extracto não coincidem, pelo que a sua falsidade é
evidente.
Aliás,
15º
Ainda que as datas
coincidissem, a verdade é que uma chamada frustrada em caso algum aparece
mencionada num extracto telefónico, a não ser que pela autora tenha sido mal empregue
o termo “frustração”, no qual não se compreende o não atendimento de uma chamada
telefónica, parecendo ser esse o intuito.
16º
Quanto à paralisação
dos serviços da Direcção de Aquisições, é manifesta a incoerência nas datas entre
o referido na petição inicial (23 de Dezembro de 2011 a 3 de Janeiro de 2012) e
no documento supradito como prova (23 de Março de 2011 a 03 de Janeiro de 2012.
17º
Fazendo um réu um esforço
de interpretação e de boa-fé das alegações apresentadas pela autora dos
documentos por ela juntos ao processo, facilmente se equaciona a falsidade de
alguns meios de prova pela autora indicados, das quais deverá vossa Excelência
retirar as devidas ilações. Pouco faltou para que a autora alegasse que o país
se encontrava em guerra civil (tendo em conta a duração exageradamente longa da greve).
18º
Relativamente ao
articulado 23º, apesar de considerarmos que é irrelevante para a presente causa
saber onde se encontrava o Ministro António Luís da Borga, já que a autora demonstrou
tanto interesse pelo paradeiro da pessoa do Ministro, fazendo-lhe a vontade aproveitamos
para esclarecer que, ao contrário do que foi alegado pela autora, este não se
encontrava em viagem de lazer mas sim na Base das Lages em visita oficial
conforme entrevista anexada ao processo (Anexos 7,8 e 15).
19º
Mais uma vez, é
evidente a má-fé da autora. Apesar de termos procedido ao envio de uma carta
registada à autora para esta proceder à entrega (como consta no articulado 25º
da douta petição inicial), a junção do aviso de recepção seria impossível
atendendo a que ele é devolvido ao remetente, neste caso o réu.
20º
Dão-se por admitidos os
factos alegados nos articulados 26º a 35º da douta petição inicial.
21º
É alegado pela autora
no articulado 40º “Tendo em conta o
complexo processo de construção das viaturas em causa e por força do atraso
causado pela situação inesperada invocada no Art. 31º, as partes acordaram que
o atraso de três meses se imporia a todas as outras prestações contratuais”.
Sobrevém que,
22º
A autora não juntou
prova, cabendo à ré por este meio impugnar o dito acordo mencionado no
articulado 40º da douta petição inicial.
23º
Têm-se por verdadeiros os factos aludidos nos
articulados 41º a 48º.
24º
O Réu recebeu uma carta
da Organização das Nações Unidas (doravante ONU) no dia 11 de Julho de 2011,
nos termos da qual foi solicitada a entrega de 100 viaturas militares blindadas
Pãoduro até ao dia 30 de Outubro do
mesmo ano (Anexo 9)
25º
Nestes termos, o réu,
perante a circunstância de já se encontrar a decorrer um concurso público com
vista ao fornecimento deste tipo de objecto, celebrou um contrato com a autora
(vide articulado 1º).
I.2
– DE DIREITO
26º
Foi efectivamente
celebrado um contrato de aquisição de bens móveis, nos termos do artigo 437º do
Código dos Contratos Públicos (CCP).
27º
Foi estipulado que a
primeira prestação seria cumprida no dia 30 de Setembro de 2011, o que em
respeito do princípio da pontualidade, no âmbito do artigo 406º n.º 1 Código
Civil (doravante CC), deveria ter sido estritamente satisfeito (762º CC).
DA
MORA DO DEVEDOR
28º
Ao contrário do alegado
pelo autor no articulado 64º, parece-nos não existir mora do credor, leia-se o
réu, mas sim mora do devedor.
29º
Entende-se existir mora
do devedor independentemente da interpelação nos casos de uma obrigação com
prazo certo (artigo 805º n.º 2/a CC).
30º
Ora, do demonstrado
supra, o devedor não só não procedeu à prestação na data convencionada (30 de
Setembro de 2011), como apenas se mostra disponível para seu cumprimento a 12
de Dezembro de 2011.
31º
A mora constitui o
devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor (art.804º/nº1 CC),
tornando-se responsável pelo prejuízo que o credor tiver em consequência da
perda ou deterioração daquilo que deveria entregar (art.807º/1 CC).
32º
Além do mais, o Réu
procedeu à interpelação do autor no dia 06 de Outubro de 2011, conforme consta
do Anexo 5.
33º
Na ausência de
cumprimento, foi enviada nova comunicação à autora (Anexo 10) no dia 27 de
Outubro de 2011 de modo a relembrar a devida prestação.
34º
Por parte da autora só
houve resposta no dia 12 de Dezembro de 2011 (anexo 9 da douta petição
inicial).
DO
RISCO:
35º
Conforme consta do articulado
24º e do Anexo 9, o Estado Português encontrava-se vinculado com a Organização
das Nações Unidas à entrega de 100 viaturas nas condições supra indicadas.
36º
Daqui facilmente se
retira os graves prejuízos do incumprimento do contrato celebrado entre o Réu e
a ONU e consequentemente a descredibilização externa daquele.
37º
Do princípio Pacta Sunt Servanta – artigo 406º CC –
decorre uma obrigação de cumprimento da vontade contratada. Assim, tendo a
autora incumprido a prestação no dia 30 de Setembro de 2011, o risco é da sua
responsabilidade.
DO
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO:
38º
Relativamente à 2ª
prestação de entrega de 60 viaturas para o dia 2 de Maio de 2012, verificou-se
um cumprimento defeituoso.
39º
Segundo ROMANO MARTINEZ
existe cumprimento defeituoso «sempre que
o devedor realiza a prestação a que estava adstrito em violação do princípio da
pontualidade do cumprimento» havendo
«uma não conformidade; uma discrepância entre o “ser” e o “dever-se”».
40º
A dia 12 de Agosto de
2012 foi recebido pelo Réu um recibo (Anexo 11) da empresa Limpa Tudo, Lda, a qual está encarregue da limpeza das instalações
do Ministério, no qual se constatou um súbito aumento de valores habitualmente
exigidos.
41º
Estes custos
extraordinários advieram de manchas de combustível que se encontravam no chão,
exactamente debaixo dos veículos blindados entregues pela autora.
42º
Foi contactado um
Engenheiro Mecânico, de seu nome Octávio Mariquinhas, que realizou a uma
análise dos ditos veículos, tendo constatado que havia um depósito de
combustível brutalmente degradado.
43º
Apesar da autora ter
executado procedido à reparação das viaturas após os acontecimentos de 25 de
Abril de 2011, pode verificar-se que as mesmas não ficaram devidamente
reparadas, havendo uma desconformidade entre a prestação devida e a
efectivamente realizada.
44º
Quando o réu aceitou as
viaturas, a 3 de Agosto de 2012, desconhecia o dano, tendo em conta que nos
termos do Caderno de Encargos cabia ao fornecedor, ora, à autora, garantir uma
inspecção qualitativa e quantitativa da prestação (Anexo 1).
45º
Constituindo o
cumprimento defeituoso um tipo de incumprimento gerador de responsabilidade
contratual, é a autora responsável nos termos do direito substantivo (798º CC).
DA
RESOLUÇÃO POR INTERESSE PÚBLICO:
46º
Prescreve o nº 1 do artigo 266º da Constituição da República
Portuguesa: “A Administração Pública visa a prossecução do interesse
público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos
cidadãos”.
47º
Outrossim, dispõe o Código dos Contratos Públicos (doravante
CCP) no seu artigo 278º: “Na prossecução das suas
atribuições, e sempre que esteja em causa o exercício da função administrativa,
os contraentes públicos podem celebrar quaisquer contratos administrativos,
salvo se outra coisa resultar da lei ou da natureza das relações a estabelecer”.
48º
O contrato administrativo é, antes de mais, um contrato, logo, fonte de
direitos mas também de obrigações recíprocas, um espaço de paridade das
partes, cuja inobservância implica responsabilidade contratual. Porém,
a sua natureza, finalisticamente ancorada no interesse público, leva a que o
mesmo seja o centro de incidência de conjunto de poderes – deveres,
funcionalmente adstritos à garantia não apenas do interesse público no
cumprimento do contrato mas, sobretudo, da prossecução daquele através da
relação contratual administrativa.
49º
Contudo, o interesse público não se confina nem se esgota no quadro de uma
concreta actuação do ente público, antes, transcende-o, constituindo, também
por isso, e em última instância, o parâmetro material da aferição da existência
e/ou da pertinência temporal da razões que ditam a mobilização da via
contratual – administrativa.
50º
Do exposto
resulta, a razão de ser do poder de resolver o contrato prematuramente
e por uma decisão unilateral sem que qualquer culpa ou falta contratual possa
ser censurada ao co contraente.
51º
O artigo
312.º do CCP dispõe na alínea b) a possibilidade de resolução por razões de
interesse público.
52º
O artigo
334º do CCP reconhece expressamente as razões de interesse público como um dos
fundamentos de e para a resolução unilateral do contrato.
53º
A propósito,
a Administração é chamada a executar, concretizando, os postulados de interesse
público decorrentes de escolhas feitas no âmbito da função política, normativa
e inovatória ou primariamente através do exercício da função legislativa.
54º
Nesse
sentido, à resolução do contrato pelo contraente público, está subjacente a
ideia de “que a administração deve poder, não obstante as
cláusulas convencionais, pôr termo aos contratos que se tornaram
inúteis ou desajustados à necessidade da colectividade, sob reserva de indemnização
do co-contratante; ela não deve ser obrigada a continuar a receber prestações
inúteis ou que já não correspondem à sua política actual”.
55º
Especialmente
presente tempo em de crise económica – financeira mundial e da problemática da
dívida pública que obrigam os Estados a reequacionar as respectivas políticas
de despesas públicas, e por maioria de razão, os encargos com as public
procurement, podendo originar não apenas decisões de não adjudicação
de contratos ou de adjudicação não acompanhadas de celebração do contrato mas
também de modificação ou, no limite, resolução contratual (Anexo 12)
56º
Além do mais, não pode a Estamos nas Lonas invocar prejuízos
resultantes a resolução do contrato pois conforme demonstra o Anexo 13 a
Embaixada dos Estados Unidos da Améria já manifestou interesse em adquirir as
viaturas.
57º
Perante o
exposto, é de concluir que:
58º
O interesse
público é o quid specificum da função administrativa do Estado
e fundamento do poder de resolução contratual pelo contraente público.
59º
A resolução
unilateral constitui uma garantia legal da prossecução do interesse público e
deve ser operada no quadro do Estado de Direito.
60º
O interesse
público justifica que o acto de resolução tenha a natureza de ato
administrativo resolutório.
61º
O poder de
resolução dos contratos administrativos, fora dos quadros da culpa, previsto no
CCP afigura-se adequado à garantia da prossecução dos interesses comunitários
definidos primariamente no âmbito das funções político – legislativas do
Estado, mas a protecção jurídico–patrimonial conferida ao co–contraente vai
além dos limites justificáveis pelo interesse público, sobretudo no contexto da
crise do Estado Pós – Social.
62º
Cabendo tudo
dentro dos limites do princípio da igualdade, da boa-fé e do pacta sunt servanda, bem como da
assunção da eventual responsabilidade que o réu pode vir a ter pela prática de
um acto lícito, nunca renunciando a ela, como já foi visto, pelas boas práticas
contratuais e processuais supra evidenciadas.
PEDIDO
RECONVENCIONAL:
63º
O réu sofreu danos
decorrentes da mora.
64º
O réu considera-se no
direito de exigir uma indemnização relativamente às constantes desconformidades
entre o acordado e efectivado, nomeadamente:
1. Pelos
danos sofridos consequentes da mora, acrescidos juros de 4%, nos termos do 806º
nº1 do CC;
2. Pelos
prejuízos decorrentes do incumprimento perante a ONU;
3. Pelos
danos resultantes do cumprimento defeituoso.
65º
Pede-se ainda a
reparação das 18 viaturas danificadas, por conta da autora, Estamos nas Lonas, S.A.
Nestes termos,
- Deve o pedido da acção ser julgado
improcedente e em consequência o réu ser absolvido do pedido;
- Deve a reconvenção ser julgada procedente
e condenar a autora a efectuar o pagamento de €100.000.000,00.
As advogadas:
Ana Laura Falcão
Ana Miranda
Bruna Bilro
Carla Silva
Inês Vieira
Rute Fernandes
Vânia Ferreira
PROVA
Testemunhal:
1.
Gilberto
Vê-Tudo: Segurança do Armazém da Direcção Geral de Aquisições do Exército
(pertencente ao Ministério da Defesa), residente na Rua da Procedência nº4 3º
Dto, 1990-325 Lisboa;
2.
Octávio
Mariquinhas: Engenheiro Mecânico, residente na Avenida da
Engenharia nº1 9º Dto, 1950-025 Lisboa;
JUNTA:
17 Anexos
Segue o link para acederem aos anexos:
https://www.dropbox.com/sh/r8mda9nd68c3xye/gSLcMqYaoZ?lst
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