As
Constituições portuguesas sempre foram, em maior ou menor medida, fonte de
Direito Administrativo, especialmente podendo-se destacar a Constituição de
1976. De facto, é de realçar os artigos 266 a 272, sem prejuízo de outras
disposições dispersas que incidem directamente sobre a Administração Pública.
De todas as disposições, poder-se-á destacar o artigo 266, onde se consagram os
princípios constitucionais da actividade administrativa. É oportuno lembrar,
antes de mais considerações, e numa fase preliminar do presente texto, a função
que os princípios desempenham, ou seja, são normas que exigem a realização de
algo, da melhor maneira possível, tendo em conta as possibilidades fácticas e
jurídicas. Da análise ao artigo 266 da CRP, limitar-me-ei a referir os
princípios que se afiguram como basilares para o tratamento da matéria objecto
de reflexão.
Neste
sentido, destaca-se o princípio da legalidade, materializado nas suas duas
dimensões: reserva de lei e preferência de lei. De forma sucinta, refira-se que
a sua primeira dimensão, consagra a submissão da actuação administrativa à
existência de lei prévia, com vista a assegurar a previsibilidade e
mensurabilidade da conduta administrativa que de forma gradual vem evoluindo
desde o Estado Liberal. Quanto à segunda, refira-se que é a ideia de
legitimidade democrática que subjaz á preferência entre actos normativos.
Pode-se
afirmar, no seguimento do atrás exposto, que não só pela dignidade
constitucional mas também pelo artigo 3 CPA a actividade administrativa se
encontra conformada pela vinculação a um padrão de legalidade.
Paralelamente, o direito a uma tutela jurisdicional efectiva
assume particular importância, pois não só com a alusão ao principio da
legalidade se efectivariam as posições jurídicas dos particulares. Estes dois
princípios devem ser olhados numa lógica de complementaridade, sendo
manifestamente redutora a visão que do Direito Administrativo Clássico ainda
perdura. Repugna-me pois uma concepção puramente objectivista do contencioso
administrativo. É inegável o alargamento da defesa das posições jurídicas dos
particulares que se vem manifestando progressivamente desde 1980 em Portugal.
Neste sentido o subjectivismo vem ganhando terreno, seja no âmbito da
legitimidade, seja no âmbito do objecto do processo. Em suma, proponho um visão
“despida” de pré-compreensões proporcionadas pela ideia duma Administração
agressiva que advém do Direito Francês. Adopto pois uma solução de equilíbrio
entre objectivismo e subjectivismo, que de resto parece que foi a consagrada no
nosso CPTA.
Após breve alusão aos princípios
constitucionais, impõe-se perceber qual o papel que a aceitação assume, quer no
plano substantivo quer no plano processual, e que relação a mesma estabelece
com os referidos princípios.
A aceitação, nos termos do artigo 56 do
CPTA, tem sido entendida como meio de renúncia ao poder de impugnação, seja
porque se reconhece a legalidade do acto ou porque se atribui um reforço da sua
eficácia . É neste sentido que Rui Machete afirma que a aceitação funciona como
“verdadeiro requisito negativo de legitimidade processual”. Segundo este
Professor, a impugnação de um acto por quem o tenha aceite determina a
ilegitimidade activa e conduz à absolvição da instância.
Primeiramente,
cumpre referir que o legislador se absteve de definir o que se deve entender
por aceitação, definindo apenas (e meticulosamente) o que se entende por aceitação
tácita, como se por recurso a um argumento a contrario fosse possível delimitar
a aceitação expressa. No mínimo, poder-se-á dizer, que à primeira vista, terá o
legislador tomado por assente o consenso em torno do conceito de aceitação. A
questão, deve-se dizê-lo, tem sido subvalorizada pela doutrina, não tendo
encontrado pronúncias suficientemente precisas e aprofundadas sobre a matéria
de que hoje trato. Neste sentido, e inconformado com a visão “pacificamente”
aceite que configura a aceitação como requisito negativo da legitimidade,
proponho uma perspectiva mais crítica mas também distinta de encarar o mesmo
problema. Interessa pois: a) delimitar a figura da aceitação, para que numa
lógica de previsibilidade os particulares possam prever que comportamento se
materializará num caso do artigo 56 CPTA b) indagar qual o alcance da preclusão
que consta do artigo 56, se o direito material será definitivamente posto em
causa c) compreender a relação e os efeitos recíprocos entre o direito
substantivo e o direito processual
a)
Comecemos pela letra da lei: ”Não pode impugnar
um acto administrativo quem o tenha aceitado, expressa ou tacitamente, depois
de praticado.”(56nº1); “A aceitação tácita deriva da prática, espontânea e sem
reserva, de facto incompatível com a vontade de impugnar.”(56nº2).
Após
uma primeira leitura, parece que a aceitação a que se refere o nº1 não
estabelece quaisquer elementos essenciais que a declaração de aceitação deva
conter, ou seja, qualquer comportamento que indicie o acatamento quer activo
quer omissivo poderá ser susceptível de poder ser qualificado como aceitação. A
definição peca por estabelecer um critério demasiado largo, o qual deixa aptos
à subsunção uma pluralidade de comportamentos. Neste sentido cabe perguntar: a
partir de que momento se pode qualificar
um comportamento como aceitação? Imediatamente à prática do acto? Quando o seu
destinatário tiver dele conhecimento? A aceitação tácita requer um estado
subjectivo de completa certeza? Como se afere esses estados subjectivos?
Postas
as questões, cabe desmistificar o sentido de aceitação constante do artigo 56
do CPTA. De acordo com o que atrás tive oportunidade de referir, o legislador absteve-se de delimitar o que se
deve entender por aceitação. Apesar do legislador não o ter feito, cabe ao intérprete
esse trabalho, que por vezes se afigura demasiado árduo. Poder-se-á buscar ao Direito Privado uma
definição prestável para o Direito Administrativo? Penso que nenhum entrave se
impõe, sendo esta aliás, metodologicamente uma via adequada, visto que segundo
um argumento teleológico nenhuma diferença substancial quer na formação da
vontade quer na sua manifestação se aparentam como antagónicas. Neste sentido é
útil chamar à colação o ensinamento do Prof. Paulo Mota Pinto para que se delimite
o que é aceitação. Segundo este Professor, como raciocínio primeiro, deve-se
distinguir aceitação expressa (pois aceitação consubstancia-se numa declaração
em sentido lato) e aceitação tácita tendo por base a dicotomia símbolo/sinal.
Passo a citar: “ utilizando a terminologia símbolo/sinal, poderemos dizer que o
símbolo tem uma estrutura representativa e substitutiva, evocando a imagem
ideal do fenómeno representado, enquanto o sinal, diferentemente apenas deixa
inferir a realidade do manifestado. O símbolo tem uma dimensão semântica
constante, uma identidade objectiva. O sinal diferentemente, muda por completo
com o contexto externo.” E ainda: “…o sinal não tem sequer uma relação
semântica constante, devendo a sua capacidade significativa inteiramente às
circunstancias em que se insere.” Sintetizando, pode-se referir, que o Prof. Paulo Mota Pinto, faz corresponder (e
a meu ver bem) a declaração expressa à utilização de símbolos, enquanto que a
declaração tácita se bastaria com o uso de sinais (sem prejuízo de se poder
usar sinais em declarações expressas e o inverso, porém tal raciocínio não se
afigura pertinente para a corrente exposição, além de que levar-me-ia a
desviar-me do objecto em estudo). Não se atribui no artigo 56, diferente
relevância jurídica à declaração expressa ou a declaração tácita O fundamental
é que saibamos de qual delas estamos a falar, e que independentemente de qual
delas está em presença, possamos constatar com certeza que “ a aceitação se efectua através de elementos
manifestantes que estão com o manifestado numa relação significativa”. A grande
diferença, reside no facto de que perante uma aceitação expressa há uma maior
certeza significativa, resultante da desnecessidade de fazer uma inferência
atendendo às circunstâncias concretas. Penso que terá sido por este motivo que
o legislador não definiu aceitação expressa, mas apesar de tomar o resultado do
comportamento como certo, deixou de definir os pressupostos para que do próprio
comportamento se possa falar. E não se pense que esta é uma “questão menor”,
pois nada tem de despiciendo quando tão grave consequência processual
(preclusão do direito impugnar) se apresenta como consequência. A distinção que
propõe o Prof. Paulo Mota Pinto é-nos útil num primeiro momento, quando se
pretende distinguir rigorosamente as duas modalidades: aceitação expressa e aceitação tácita. Porém a menção constante
do artigo 56nº2 (“espontânea e sem reserva”) desloca-nos para um segundo momento
de análise no âmbito duma aceitação tácita. Na análise que faço do referido
artigo, constato que se pretendeu dar relevo à intenção declarativa,
representando a mesma um requisito adicional quando de aceitação tácita se
possa falar. “Apela-se” a um estado subjectivo do aceitante. A presença desse
estado subjectivo no comportamento do particular, é uma condição de validade da
própria aceitação, tendo o legislador, já que quis referir-se à aceitação,
apenas andado mal, em estabelecer unicamente os requisitos de certeza e
espontaneidade na aceitação tácita. Poderá ter entendido, mais uma vez, que na
aceitação expressa tal estado subjectivo esta implicitamente reconhecido, porém
do silêncio do legislador nada se presume. Digo que é uma condição de validade
da aceitação, pelo facto de ter de existir uma imputação da correcta vontade
declarativa ao seu autor. Isto é, é imperioso saber se tendo existido um
qualquer comportamento praticado pelo particular pode este consubstanciar uma
renúncia quer expressa quer tácita ou se pelo contrário nada se pode extrair. A
ideia que subjaz ao artigo 56, prende-se com a problemática do venire contra factum proprium, ou seja,
procura-se limitar o exercício de certa posição jurídica quando o comportamento
anterior do titular da posição jurídica seja contraditório. No entanto,
acrescente-se, que esta não pode servir de via para que os tribunais
administrativos, ficcionem renúncias tácitas ou expressas. Já Ranieri referia
que: “a renúncia não se presume”, aditando ainda: “uma renúncia tácita só pode
ser derivada de um comportamento que expresse univocamente a vontade de alijar
o direito”. É pois importante, distinguir vários planos: há ou não
comportamento, o comportamento corresponde a que forma de declaração nos termos
acima delimitados, e por último, se apesar de existir um
declaração/comportamento se pode dizer que o mesmo possa constituir uma
renúncia ao direito de impugnar, não se atribuindo ao mesmo efeitos automáticos
por razões utilitaristas.
Proponho
que o artigo 56 seja interpretado com razoabilidade, sob pena do sistema
enfermar de incoerência insanável. Passo a explicar: sendo o prazo de
impugnação de três meses, será porventura ajustado coarctar esse mesmo prazo
(já de si curto) por qualquer comportamento eventualmente indiciário de
aceitação mesmo que remoto? Ou estão presentes todos os elementos essenciais
acima descritos (comportamento que se possa qualificar como indiciário, e que
haja vontade em renunciar ao direito, para de aceitação de poder falar) de
forma unívoca ou não há aceitação. Na minha opinião, mesmo se reconhecendo a
autonomia própria do legislador ordinário para intervir, tendo a afirmar que o
direito a uma tutela jurisdicional efectiva impõe que não se consagrem
restrições desproporcionadas, principalmente quando essas mesmas restrições se
fundam em critérios que de tão abrangentes extravasam a própria legitimidade do
legislador ordinário, pois colocam em causa valores constitucionais.
b) Cabe
perguntar qual o fundamento que preside à estatuição do artigo 56nº1. A meu
ver, esse fundamento não pode ser outro que não o possível comportamento
contraditório do particular. Quando se estatui uma preclusão pressupõe-se que
se quis retirar efectividade a um direito. Neste sentido, cabe também averiguar
se o escopo da norma foi alcançado e se o direito material que se quer fazer
valer processualmente se encontra de forma definitiva precludido ou se perde de
facto efectividade.
Apelando
a uma visão de conjunto do ordenamento jurídico administrativo, coloco em
confronto o direito substantivo e o direito processual, numa tentativa de indagar
se há ou não perda de efectividade/preclusão. Os mais cépticos dirão que
estamos em dois planos distintos, substantivo e processual, e portanto não será
comparável, mas esse é mais um argumento para se poder questionar a
acertividade do artigo 56. Vejamos. A própria natureza adjectiva do direito
processual faz pressupor que cabe, por via do direito processual fazer valer os
direitos atribuídos por via substantiva, não sendo o inverso a situação típica
por excelência. Poderá o mesmo efeito ser alcançado por via substantiva?
Penso
que sim, com o recurso às garantias administrativas. O artigo 56 prescreve a
preclusão de impugnação, não a da reclamação, recurso hierárquico, recurso
tutelar ou até mesmo da revogação do acto praticado pelo delegado.
Apenas
se poderá afirmar que a propositura de garantias não-contenciosas não logrará o
mesmo efeito, caso se considere que não existe um dever-juridico de revogar
actos inválidos. No entanto, considero que há um dever jurídico cujo
cumprimento a Administração se encontra obrigada. Num Estado de Direito, que
proclama o principio da legalidade como padrão conformador de toda a actuação
administrativa, repugna-me aceitar que um órgão administrativo, tendo diante de
si um acto que reconhece ser ilegal e podendo revogá-lo não tenha o dever de
revogar. Admitir que um órgão administrativo possa recusar-se a fazê-lo seria
subverter o principio da legalidade, esvaziando-o de sentido, colocando o
cumprimento da legalidade na disponibilidade do órgão competente. É certo que
ainda assiste a faculdade de sanar o acto, mas essa faculdade em nada desvirtua
a construção teórica que aqui enceto. O que não se pode admitir, com base numa
interpretação dos valores axiológicos do sistema administrativo, é que o órgão
administrativo deixe o acto inválido sanar-se com o decurso do tempo, pois
seria admitir que lhe assistiria o direito de se prevalecer de uma ilegalidade
“qua tale”, em vez de praticar novo acto com vista a repor a legalidade
aproveitando o conteúdo do acto anterior. Não se pode equiparar o valor
jurídico das duas alternativas, na sanação por iniciativa do órgão
administrativo, há uma vontade jurídica de repor a conformidade, em homenagem
aos princípios da boa-fé e da tutela da confiança (art.6-A CPA, art. Art.4
CPA), enquanto que no segundo caso, há uma inactividade que redundará na
sobrevigência de actos inválidos que se tornarão válidos pelo decurso do tempo.
Em
suma, três vias poderão apontar-se: se o particular fizer uso das garantias
administrativas, tendo este direito a uma decisão justa, haverá um dever de
revogar actos ilegais (artigo 52nº1 CRP, art. 9 CPA, art.3 CPA, art.6-A CPA),
noutra possibilidade, caso o particular não se manifeste, ainda subsistirá o
dever de revogar os actos inválidos antes do decurso do prazo de sanação (pois
só desta via se salvaguarda a legalidade administrativa/direitos dos
particulares) por via oficiosa (art.138 CPA), em último lugar, como alternativa
poderá o órgão administrativo sanar, caso queira, o acto administrativo
(art.137 CPA).
Neste seguimento, pode-se afirmar que o direito material que
a aceitação visa precludir poderá, com grande probabilidade ganhar plena
efectividade. Se contrapusermos o artigo 56 com o artigo 141 do CPA, pode-se
constatar que mesmo que se considere como admissível a aceitação nos termos
consagrados no 56, o escopo desse mesmo artigo não é absolutamente
salvaguardado (segurança jurídica/sobrevigência de efeitos ilegais), pois segundo
o artigo 141 o acto poderá ser revogado tendo como veículo as garantias
administrativas. Não se pode impugnar, mas pode-se fazer uso dos artigos 158 a
177, não sendo obstáculo a coincidência do prazo de interposição de algumas
garantias com o prazo de impugnação,
visto que quer se accione antes quer
depois, as garantias não-contenciosas serão admissíveis apenas diferindo segundo um juízo de
oportunidade por parte do titular que as exerça.
Penso que é contraditório que se retire legitimidade ao
particular, deixando porta aberta para que o mesmo obtenha o mesmo efeito por
via administrativa. E não vejo neste argumento qualquer inflexão de planos,
pois esta não é puramente uma questão apenas processual, mas também uma questão
material. O respeito pela legalidade deve ser o mesmo, quer se esteja em juízo,
ou unicamente num procedimento administrativo. O direito em causa é o mesmo,
quer se esteja em juízo ou num
procedimento administrativo. Não deveria o mesmo comportamento produzir os
mesmos efeitos? Ou pretende-se com o artigo 56 que o particular efective o seu
direito por via de uma tutela mais “enfraquecida”? Não é esta uma inflexão ao
direito a uma tutela jurisdicional efectiva? Não colocaria tais questões se
também por via administrativa o direito material não pudesse ser alegado, pois resultaria
daí que uma vez que é negado ao particular o acesso a que se dirima o litígio em tribunal, não seriam os órgãos administrativos os últimos garantes da
efectivação do direito do mesmo.
c)
Ficou claro, que o artigo 56 não assegura de
forma plena a preclusão do direito material, muito menos a sua efectivação. Apesar
dessa constatação, ainda subsistem algumas considerações, que passo a referir. Primeiramente,
importa realçar a redacção do artigo 38 CPTA “Nos casos em que a lei
substantiva o admita, designadamente no domínio da responsabilidade civil da
Administração por actos ilegais, o tribunal pode conhecer, a titulo incidental,
da ilegalidade de um acto administrativo que já não possa ser impugnado” (nº1).
Sejamos pragmáticos, com o que acabámos de dizer, será provável que um
particular só possa fazer valer o seu direito material mediante a propositura
de uma garantia administrativa, enquanto que poderá pedir uma indemnização seguindo
a forma de acção administrativa comum, desde que não preencha o condicionalismo
do referido artigo (no seu nº2). Ou seja, promove-se uma defesa bipartida,
negando ao particular uma defesa conjunta que seria proporcional aos interesses
em causa. Vejamos com mais pormenor, o particular cumulando os seus pedidos,
poderia até ver os dois rejeitados por estarem numa lógica de prejudicialidade
(ou inversamente ambos aceites), a legalidade seria reposta pela possível remoção
de um acto inválido além de que se atribuiria um sentido útil ao principio da economia processual. Ainda se diga, que não deixa de ser
antagónico que se atribua um direito a uma indemnização(pois é um direito que pode ser deduzido segundo acção administrativa comum, poderia ser outro direito), com base num acto que
antes não se permitiu impugnar.
Por último, não se
pense que do artigo 56 do CPTA emerge somente a preclusão da legitimidade
processual. Inquietou-me nomeadamente, a contraposição entre o artigo 56 e o
artigo 4 da Lei nº 67/2007 de 31 de Dezembro. O artigo 4 da referida lei
precreve; “Quando o comportamento culposo do lesado tenha concorrido para a
produção ou agravamento dos danos causados, designadamente por não ter
utilizado a via processual adequada à eliminação do acto jurídico lesivo, cabe
ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e
nas consequências que delas tenham resultado, se a indemnização deve ser
totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.”. Como se harmonizam estes
dois artigos? Se o direito de accionar o meio processualmente adequado se
encontrava precludido, perderá o particular o direito a uma indemnização? O
artigo 4 prevê um verdadeiro ónus para o particular, o qual só poderá ser
afastado designadamente com o recurso a meios contenciosos. Será que este
artigo se quer referir aos outros meios contenciosos que não a impugnação de
acto administrativo, por só este direito se encontrar precludido? Penso que
não, pois apesar de existirem vários meios contenciosos, poderá ser o mais apto
a impugnação do acto administrativo, quer por razões funcionais, quer por não
se encontrarem reunidos os requisitos para o decretamento de outros.
Entendo que o particular,
deve poder lançar mão da impugnação de acto administrativo, pelos motivos atrás
enunciados mas também pelo facto de mesmo que se considere que houve aceitação
por parte do particular, esta não poder ser facto bastante para exonerar a
Administração do dever de indemnizar,
pois tem de ser feita uma valoração das condutas de ambos, o que só pode
acontecer em juízo. Por conseguinte, penso que os efeitos da admissibilidade da
aceitação se apresentam mitigados, ou mesmo sem qualquer relevância no caso.
Em suma, mais que duma perspectiva de iure constituendo, procurei tratar
o instituto da aceitação de uma perspectiva de iure constituto, dando sentido
às perguntas que “encontrei” sem resposta. Como nota final, dizer que a actual
redacção do artigo 56 é infeliz. Seja pela sua incapacidade para traçar um
critério estreito de delimitação de comportamento, seja pela promoção de
efeitos distintos ao nível da efectivação de direitos, ou ainda pelo facto de
se encontrar em manifesta contradição com normas substantivas que ao direito
processual caberia, em primeira linha efectivar, poder-se-á dizer que a
aceitação desempenha um papel de pouca utilidade no plano processual.
Diogo
Giroto nº18643 subturma 6
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c)
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